Vejam trechos de um estudo muito bem elaborado sobre a estratégia de controle das massas, anulando a identidade de cada cidadão.
“Política em Goebbels”, ministro da propaganda de Hitler
Um estudo sobre a produção da publicidade
a partir de seus Diários
Luís Mauro Sá Martino
Jornalista, doutor em Ciências Sociais pela PUC/SP,
professor da Faculdade Cásper Líbero (SP).
O objetivo deste trabalho é explorar alguns aspectos da estética da propaganda política alemã nos anos 1933-1945 conforme apresentados nos diários políticos de Joseph Goebbels, Ministro da Propaganda de Hitler.
De toda a escória dirigente nazista, Joseph Goebbels é, de longe, a figura mais complexa.
Doutor em filosofia, criador da propaganda política moderna – todos os marqueteiros lhe devem alguma coisa – Goebbels usou seu talento para consolidar o regime brutal do qual se orgulhava de fazer parte.
Goebbels anotava meticulosamente seus trabalhos no diário.
Foram centenas de páginas mostrando o funcionamento da máquina de destruição alemã, mostrando uma frieza e um cálculo espantosos.
Não faltam auto-referências elogiosas, leiam algumas de suas anotações:
“Causou profunda impressão meu discurso aos trabalhadores”.
“Com efeito, dez anos são passados desde quando criei o Ministério da Propaganda, como um novo instrumento de orientação do povo alemão.”
“Os nossos propagandistas são melhores. Dia e noite, noite após noite, estão em contato direto com as massas.”
“A propaganda ideológica permite disseminar, para toda sociedade, de forma persuasiva, as idéias de um determinado grupo. A ideologia, dessa forma, se espalha e impregna todas as camadas da sociedade.”
“A política noticiosa é uma arma de guerra. O objetivo é sustentar a guerra e não fornecer informações.”
Nesse sentido, a propaganda ideológica tem um alcance muito maior do que sua correlata comercial. A ideologia deve ser transformada em prática pela propaganda:
“Sua função é formar a maior parte das idéias e convicções do indivíduo, e com isso orientar seu comportamento social.”
A teoria da propaganda de Goebbels, em linhas gerais, pode ser resumida em um princípio: as massas são ignorantes, portanto a mensagem deve ser direta; portanto, a propaganda deve agradar; para tanto, seu modelo não é a política, mas o entretenimento.
“Essa propaganda não mais designa objetivos concretos. Ela se derrama por meio de gritos de guerra, imprecações, de ameaças, de vagas profecias.”
Goebbels fez questão de manter a propaganda simples e fácil de ser assimilada por qualquer espécie de público.
(ASSIM FAZEM SEUS SEGUIDORES)
E isso o leva a explicitar, pela única vez em seus Diários, um protótipo de teoria da propaganda:
“A propaganda deve, portanto, ser sempre essencialmente simples e repetida. Afinal de contas, obterá resultados práticos, no sentido de influenciar a opinião pública, aquele que puder reduzir os problemas à sua expressão mais simples, e que tenha coragem de persistir em apresentá-las sempre na sua forma simplificada, apesar das objeções dos intelectuais.”
O ataque pessoal, fruto de sua experiência política como orador do partido e administrador de Berlim, era uma constante.
A utilização símbolos alegóricos, imagens e uniformes era a forma de o movimento mostrar seu caráter ‘sério’, ou, em última instância, ‘oficial’.
No entanto, mais do que a complexa simbologia, diversão era a palavra-chave. Note-se que aqui usamos a palavra ‘diversão’ não em seu sentido estrito, relativo a ‘fazer rir’, mas também como a maneira de distrair as massas, ainda que para isso fosse preciso fazê-las chorar.
A carga emocional lançada sobre a assistência era muito grande. Além disso, Goebbels era especialista em ridicularizar seus adversários. Despertar emoções era sua prioridade, pois é muito mais fácil absorver uma mensagem quando esta não passa pelo crivo da razão.
O mais espantoso talvez seja o sucesso de Goebbels no sentido de direcionar o descontentamento do povo alemão para o ódio aos judeus, ao capitalismo e a qualquer outro inimigo declarado do regime.
A tarefa do ministério da propaganda era manter os alemães presas fáceis do mito do herói personalizado na figura do líder da pátria.
Afinal, se a propaganda tinha se tornado uma arma, Goebbels sabia encontrar, no elenco de temas populares, espaço para o melodrama e tinha noção do quanto um apelo místico pode ser eficaz.
E não deixa de ser emblemática uma recomendação anotada em seu diário que parece fazer parte do breviário do arsenal representativo moderno:
“Quando precisa, o Diabo passa por anjo.”