Leia editorial do Estadão:
Quem suceder ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva só poderá construir o futuro e consolidar o Brasil como grande economia se for capaz, em primeiro lugar, de proteger a estabilidade conquistada a partir dos anos 90.
Precisará cumprir uma longa agenda para modernizar o País, torná-lo tão competitivo quanto as economias mais dinâmicas e garantir seu lugar entre as potências.
Mas, para isso, o governo terá de abandonar o voluntarismo, renunciar à farra com dinheiro público e retomar o caminho da responsabilidade.
Esse caminho foi claramente abandonado e a mais nova comprovação desse fato é a escandalosa manipulação das contas públicas.
Nenhum avanço teria sido possível, nos últimos oito anos, sem a base construída até 2002.
O combate à pobreza teria sido muito menos eficiente se a inflação desenfreada continuasse corroendo cada aumento salarial e cada centavo das políticas sociais.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reconheceu esse fato e por isso respeitou a ação do Banco Central, mesmo contra as pressões dos companheiros e aliados.
Mas seu compromisso com a política responsável tem sido cada vez mais frouxo - tanto mais frouxo quanto maior a sua dedicação ao jogo eleitoral e ao seu projeto de poder.
O próximo governante deverá, portanto, enfrentar uma dupla tarefa, se não quiser condenar-se ao fracasso. Terá de afastar o risco de um retrocesso, preservando o tripé da estabilidade: uma política realista de metas de inflação, respeito à responsabilidade fiscal e câmbio flutuante.
Para manter esse rumo, terá de corrigir uma série de desvios.
Precisará conter a expansão do gasto corrente, abandonar a demagogia com os salários do setor público, renunciar ao empreguismo e ao aparelhamento do governo.
Deverá buscar a eficiência do setor público - inaceitável para a ideologia petista - e buscar o máximo retorno para cada centavo do orçamento.
Uma efetiva poupança pública será indispensável tanto para o crescimento seguro da economia quanto para a adoção de uma política anticíclica digna desse nome, como a adotada, por exemplo, no Chile: economizar em tempos de prosperidade para gastar nas fases difíceis.
Com o manejo responsável e eficiente do dinheiro público, realizar a decantada reforma tributária será muito mais fácil. Será necessária, naturalmente, uma complicada negociação com Estados e municípios, uma tarefa evitada, durante oito anos, pelo presidente Lula.
Se o próximo governo fracassar nesse item, por incompetência ou indisposição para missões difíceis, o empresário brasileiro continuará em séria desvantagem no jogo internacional.
Mais que isso, poderá encontrar dificuldade crescente para competir e, portanto, para produzir e criar empregos.
Todos os candidatos prometeram trabalhar por essa reforma.
Nenhum, no entanto, detalhou a promessa nem disse como enfrentará a tarefa.
Se quiser garantir uma nova e prolongada prosperidade, quem suceder ao presidente Lula deverá resistir à tentação de controle pessoal ou partidário da economia.
Terá de renunciar à ideia de reestatizar empresas bem-sucedidas no setor privado e também ao uso de instrumentos de governo, como os bancos públicos, para operações promíscuas.
Não faltarão empresários dispostos a construir com o grupo governante esquemas de dominação econômica disfarçados de projetos nacionalistas.
O germe de um capitalismo de compadrio e de favores já se instalou e prosperou nos centros de poder nos últimos anos.
É tempo de combater esse germe, não só em benefício da economia, mas também do regime democrático.
A construção do futuro dependerá igualmente de um retorno à diplomacia realista e eficiente, guiada pelo interesse nacional bem compreendido e não por ilusões ideológicas dos anos 60.
Seja quem for o novo ocupante do Palácio do Planalto, precisará de ideias claras e de muita determinação para cuidar dessas tarefas.
Enfrentará pressões de grupos instalados no aparelho estatal e de grupos nutridos pelo setor público e acomodados à sua sombra, como os agentes do peleguismo sindical e estudantil.
A construção, em algumas áreas, dependerá de um trabalho prévio de demolição.
Por Reinaldo Azevedo
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