quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Acima de tudo Machista

Por Reinaldo Azevedo

A frase, como sabem, é do governador do Rio, Sérgio Cabral, e foi dita durante um seminário da revista “Exame”, em que se discutiam oportunidades de negócios no estado por conta da Copa de 2014 e da Olimpíada de 2016.
Não sei se Cabral se referia ao assassinato dos fetos no capítulo das oportunidades de negócios ou se fazia apenas uma digressão descompromissada sobre seu horizonte utópico.

A tese de Cabral é, em si, constrangedora, mas o tom meio cafajeste de sua linguagem não choca menos: é ligeiro, leviano, irresponsável, deseducado, deseducador e, acima de tudo, machista, aspecto este que chama particularmente a atenção num momento em que uma mulher chega à Presidência — também ela, é bom notar, favorável à legalização do aborto, embora tenha dito o contrário para os leitores.

Cabral, lembre-se, é o patrono do ministro da Dengue, José Gomes Temporão, um fanático da causa.
Se este senhor tratasse o mosquito com o mesmo rigor com que gostaria de tratar os fetos, estaríamos livres da doença…


Aborto, no Brasil, é crime, e, se há políticos que acreditam que deva ser descriminado, que levem adiante a sua causa.
O mesmo vale, por exemplo, para as drogas — aliás, o governador também é favorável à legalização das “leves”…
O que um governante não pode, por descabido, inaceitável e ilegal, é praticar este misto de naturalização com apologia do crime, tendo a ousadia de convidar os homens da platéia a confessar que tiveram “uma namoradinha” que fez aborto.

O sujeito quer defender o direito de matar os fetos?
Ok.
Mas que tenha a coragem de fazê-lo sem precisar maquiar a sua tese com dados falsos.
A fala de Cabral é mentirosa porque INEXISTE NOS SISTEMAS PÚBLICO E PRIVADO DE SAÚDE uma notificação para “aborto provocado”.
Qual é a base de dados deste senhor?
Nenhuma!

Um milhão de abortos provocados por ano no Brasil?
O SUS, e estes são dados oficiais, realizou 3,1 milhões de curetagens entre 1995 e 2007 — 3,1 milhões ao longo de 13 anos!
Nascem entre 2,8 milhões e 3 milhões de crianças a cada ano no país.

Qualquer especialista sabe que a taxa de aborto espontâneo é da ordem de 25%.

Assim, notem bem!, se não houvesse um só aborto provocado, aqueles 3 milhões seriam 75% do total de fetos gerados, que chegariam, então, a 4 milhões.
Só os abortos espontâneos somam, portanto, um milhão!
Desse total, quantos resultaram em procedimentos no SUS?
Façam a média anual!

O bufão fatalista está convencido de que todos compartilham de suas fraquezas morais ou éticas: “A gente engravida uma moça…”
Esse “a gente”, suponho, apelava aos homens presentes, e as moças devem se contentar com o papel de receptáculos das sementes, as cabritas prenhas dos bodes descontrolados.


Em 2007, Cabral, pai de cinco filhos, já havia concedido uma entrevista ao G1 em defesa do aborto.
E expôs os seus motivos: “Tem tudo a ver com violência.
Você pega o número de filhos por mãe na Lagoa Rodrigo de Freitas, Tijuca, Méier e Copacabana, é padrão sueco.
Agora, pega na Rocinha.
É padrão Zâmbia, Gabão.
Isso é uma fábrica de produzir marginal”.


Vocês já sabem que o lulista Cabral é um progressista, e eu, um “reacionário”.
Eu, por reacionário, acho que o crime é uma escolha que pode ser feita por pobres e ricos.
Ele, por progressista, vê em cada pobre um suspeito.

Uma das notáveis contribuições de Cabral ao debate é propor que acabemos com os crimes legalizando-os; a outra, que acabemos com a pobreza acabando com os pobres.

Cabral: sem medo da represália dos fetos!
O Rio não pode continuar como está, sabemos.
Noto que o governador está empenhado em fazer nascer menos pobres.
É preciso mais ousadia.
Em 2007, já fiz esta proposta ao valente político.
Por que não combinar a redução drástica de nascimentos de pobres com a elevação também drástica de nascimento de ricos?
Não seria legal?
Pensem bem: se, por meio do aborto, conseguíssemos quase zerar os partos da Rocinha e, por meio da Bolsa Gente Que Pode, decuplicar os de Ipanema e Leblon, é claro que o Rio seria uma cidade melhor, certo?

Cabral agrediu o decoro, o bom senso, as mulheres, o sexo seguro, a vida.
Dada a forma como se expressou, fez a apologia de uma prática criminosa.
Mas é possível que muitos o elogiem pela coragem com que enfrenta os fetos de peito aberto, sem temer represálias.
Anotem: Sérgio Cabral é candidato a ocupar a vaga aberta por Lula no besteirol nosso de cada dia.
Esse rapaz tem grandes ambições!

Nenhum comentário:

Postar um comentário