Julia Duailibi - O Estado de S.Paulo
Um dos principais contribuintes do programa econômico do PSDB na eleição de 2010, o economista Gesner Oliveira nega que a proposta de um salário mínimo de R$ 600, derrotada na Câmara na semana passada, seja demagógica.
"Deve ser vista em conjunto com propostas muito mais audaciosas de corte de gastos", afirmou ao Estado.
Presidente da Sabesp na administração José Serra em São Paulo e presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) na gestão FHC, avalia que o corte orçamentário de R$ 50 bilhões anunciado pela equipe econômica foi "insuficiente" e diz não haver credibilidade nas estatísticas fiscais feitas pelo governo.
Qual avaliação faz do começo do governo Dilma Rousseff?
É prematura qualquer avaliação definitiva.
Mas questões e dificuldades da economia persistem.
Chamo a atenção para anomalias de um juro real elevado, carga tributária grande em comparação às economias emergentes e problema sério de competitividade associado à precariedade da infraestrutura.
E a tendência forte da apreciação do câmbio.
A combinação desses elementos é perversa.
Não há sinais de como isso será atacado.
Apesar desse quadro, a economia está crescendo.
Houve avanços em vários segmentos: em políticas estaduais e também um empreendedorismo pujante.
Mas a política econômica não acompanhou esses espaços e impede que o Brasil cresça de forma equilibrada.
Muitas vezes, um movimento de expansão gera satisfação que encobre desequilíbrios sérios.
O debate fica mistificado em torno de uma ou duas questões, quando você precisa ver que há uma economia que funciona de maneira anômala.
Qualquer médico percebe que esse organismo não está bom.
Não adianta crescer de qualquer maneira.
O corte de R$ 50 bilhões no Orçamento é um passo para uma política fiscal mais austera?
É insuficiente e não aborda a questão central da natureza qualitativa do problema: o nível e a composição dos gastos.
É preciso não apenas pensar na redução do gasto, mas na redução qualitativa, cuja composição não prejudique investimentos e assegure a redução de despesas correntes.
Além disso, nos últimos anos, houve crescente perda de credibilidade nas estatísticas fiscais em função da chamada contabilidade criativa.
A capitalização do BNDES pelo Tesouro, por exemplo?
E também as inúmeras maneiras de artificialmente se elevar a receita e subestimar a piora nos números do superávit primário.
Isso acaba diminuindo a credibilidade das contas fiscais.
A maioria dos analistas passou a fazer contabilidade paralela porque os números do governo deixaram de refletir com fidedignidade a realidade das contas públicas brasileiras.
Como viu a aprovação do mínimo de R$ 545 na Câmara?
O sr. participou do programa de governo do PSDB, que propôs R$ 600.
Alguns analistas acusaram a proposta de ser demagógica.
A proposta não pode ser vista separada de um ajuste fiscal forte.
Faz parte de uma proposta global que agrega ajuste fiscal, eliminação de desperdícios e elevação do salário mínimo.
Deve ser vista em conjunto com propostas muito mais audaciosas de corte de gastos e de eliminação de desperdícios.
Mas sem "propostas mais audaciosas de corte" os R$ 545 não seriam atitude mais prudente?
A proposta, para ser coerente, é global.
Não pode ser vista separadamente, olhar o salário mínimo sem as estimativas de receita da Previdência, as possibilidades de racionalização de gasto.
A diminuição do ritmo de crescimento no último trimestre de 2010 torna a inflação menos preocupante neste ano?
É uma preocupação.
A composição da inflação é dura com os que ganham menos.
Estamos perto do teto, numa economia que já apresenta uma enorme anomalia, uma grande taxa de juro real.
E há muito ruído nas informações oficiais.
Essa combinação gera preocupação.
O sr. tem feito consultorias na área ambiental.
A eleição trouxe para o debate político a agenda verde.
Como vê o começo do governo Dilma neste setor?
A impressão que dá é que a discussão morreu.
Quais as propostas do Brasil para uma economia de baixo carbono?
A população deu sinal positivo na aprovação da agenda.
Mas até agora não há sinal de que isso se traduza em políticas concretas.
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