segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Um problema de lógica

No blog do Alon

O governo diz que não pode dar agora um salário mínimo maior que R$ 545.
Mas promete um de R$ 620 para daqui a dez meses.
A economia não vai crescer nesse ritmo daqui até lá.
Então ou o governo não vai cumprir a promessa ou poderia dar mais agora

A proposta do governo para o reajuste do salário mínimo embute uma conclusão surpreendente.
Se R$ 545 é o máximo que a economia e as contas públicas suportam este ano e se o próprio texto já contrata uma correção de 14% para o ano que vem, conclui-se que para suportar o aumento a economia brasileira (e junto a receita do governo) deverá expandir de 2011 a 2012 pelo menos o dobro do previsto.

Se descontar dos 14% uns 6% de inflação chegamos a um PIB necessário de 8% em 2011.
Uma repetição do número de 2010 que dará base ao reajuste de 2012.
Haveria um alinhamento ideal entre a regra e a disponibilidade de caixa.

Mas as projeções para o PIB de 2011 oscilam perto de 4%, metade daquilo.
Se a receita da Previdência Social acompanhar o ritmo, o governo estará contratando para o ano que vem junto com o aumento de 14% no salário mínimo um baita buraco para o ministro Garibaldi Alves administrar.

Só um brutal aumento de impostos teria a capacidade de afinar a dupla sertaneja formada pelo “máximo que podemos pagar agora” e o reajuste já acertado de 14% em 2012.

Ou então haverá um estouro da dívida pública para bancar custeio.
Improvável.

Suponhamos que a arrecadação vai dar conta do salto na despesa. Aí aparece outro problema.
Se as receitas governamentais vão crescer com essa folga daqui para o final do ano, capazes de cobrir logo adiante um aumento de 14% no salário mínimo, oito pontos percentuais acima da inflação, por que o Planalto anuncia que precisa promover ao longo de 2011 um megacorte de R$ 50 bilhões?

As diversas falas governamentais não conseguem dialogar entre si.
Não há equação que feche o “maior salário mínimo que infelizmente podemos pagar hoje” mais a promessa de 14% de reajuste ano que vem mais a necessidade de um megacorte orçamentário ao longo de 2011.

Não é razoável que o governo pense em recuar dos 14% em 2012.
Não haveria condições políticas.
Seria suicídio.
Então, de duas uma.
Ou suas excelências planejam um belo aumento de impostos daqui até lá ou -mais provável- as contas de agora suportariam perfeitamente um salário mínimo maior que R$ 545.

Eu cravo esta última opção.
O governo tem hoje como fixar, responsavelmente, um mínimo maior que R$ 545.
Se não tivesse, não assumiria o compromisso de um aumento de 14% daqui a poucos meses.
A economia não vai expandir nessa velocidade daqui até lá.

Mas como possui uma base de apoio muito ampla e suporte maciço na elite para endurecer com os trabalhadores, tem capital político para aplicar um aperto providencial em época que pede exibições de austeridade.

Este ano o governo vai brecar a inflação com o freio do arrocho salarial.
Vai deixar o salário mínimo desprotegido numa hora de inflação forte.

Vai fazer caixa para pagar juros às custas da turma que recebe salário mínimo e dos aposentados e pensionistas.

Não parece muito preocupado com os efeitos políticos, pois daqui até 2014 terá três oportunidades para reajustes que o reconciliem com esse último pessoal.
Pelo menos com o pedaço que sobreviver.

Sobre o argumento da necessidade de cumprir o contrato firmado com as centrais sindicais, o governo do PT não seguiu tal fundamentalismo quando a Bolívia exigiu rediscutir o contrato de fornecimento de gás, nem quando o Paraguai exigiu rediscutir as normas da parceria em Itaipu.

Nas duas ocasiões o Brasil considerou que cobrar leoninamente o cumprimento do contrato seria uma violência contra a parte mais frágil.
Politicamente não convinha.

Desta vez o governo parece acreditar na conveniência de ser intransigente.
O governo tem esse direito.

Só dá pena que tenha decidido fazer a exibição de músculos contra quem não tem defesa.

E retomando a velha e desgastada ladainha de que qualquer aumento real para o salário mínimo agora será um problema.
Um risco para a inflação.

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