:: A um artigo cheio de idéias, reage-se como uma torcida num Fla-Flu.
Por Sérgio Vaz
Às vezes parece que o Brasil não merece Fernando Henrique Cardoso.
Seu artigo “O Papel da Oposição”, escrito para a revista Interesse Nacional e publicado na íntegra no Blog do Noblat, é, como tudo o que FHC escreve, brilhante, fascinante, sério e profundo sem ser chato.
Ao contrário: o texto dele está cada vez mais gostoso, fácil de ler, agradável.
Fernando Henrique traz à baila, para que sejam discutidas, diversas idéias, variadas informações.
Entre elas:
- A oposição “não pode se acomodar com a falta de autocrítica e insistir em escusas que jogam a responsabilidade pelos fracassos no terreno ‘do outro’”;
- O PT é “contorcionista”; sua defesa do socialismo é só para enganar trouxas; nacional-desenvolvimentismo é só uma etapa; o que ele busca é o hegemonismo – e a oposição deveria expor isso;
- Setores da oposição, mesmo no PSDB, ainda acreditam nas “mensagens atrasadas do esquerdismo petista ou de sua leniência com o empreguismo estatal”;
- O petismo no governo tem diminuído o papel político dos governadores, “bastião do oposicionismo em Estados importantes”: “a relação entre prefeituras e o governo federal saltou os governos estaduais e passou a se dar mais diretamente com a presidência da República, por meio de uma secretaria especial colada ao gabinete presidencial”.
São apenas uns poucos exemplos de tópicos importantes que Fernando Henrique coloca na mesa para discussão.
E o que fazem os jornais e os próprios líderes dos partidos de oposição?
Apegam-se única e exclusivamente à frase em que o ex-presidente usa a palavra “povão” – uma frase, de resto, de perfeita lógica, carregada de sentido:
“Enquanto o PSDB e seus aliados persistirem em disputar com o PT influência sobre os ‘movimentos sociais’ ou o ‘povão’, isto é, sobre as massas carentes e pouco informadas, falarão sozinhos”.
O sociólogo tarimbado, o político que na presidência fez este país avançar uma enormidade, o presidente de honra do maior partido de uma oposição hoje em frangalhos propõe uma discussão, apresenta diversas idéias, considerações – e a reação é toda em cima da palavra ‘povão’.
No meio das declarações apatetadas dos líderes oposicionistas, só Dora Kramer veio defender a inteligência, em seu artigo desta quarta-feira no Estadão.
A pensata de Fernando Henrique sobre o papel da oposição, disse ela, não requer apoio ou repúdio, mas um exame detido.
“É um roteiro”, escreve ela.
“Que pode ser visto como um convite à reflexão sem que necessariamente se concorde em tudo com ele.”
É para refletir, meu Deus do céu e também da terra.
Não é para gritar palavras de ordem como se fosse um Fla-Flu.
O problema é este: às vezes a oposição – e até a imprensa – fazem um esforço danado para demonstrar que o país está condenado à burrice.
Que não merece Fernando Henrique Cardoso.
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