O Estado de S.Paulo
Editorial
É assustadora a tranquilidade exibida pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, diante do evidente surto inflacionário e das condições nada invejáveis das contas públicas brasileiras.
Ele tem fracassado seguidamente nas tentativas de enfrentar alguns dos mais prementes problemas, como o ingresso maciço de dólares.
O anúncio de cada nova barreira é seguido de mais uma enxurrada de moeda americana e de mais uma rodada de valorização do real.
Nada parece, no entanto, abalar seu otimismo e sua aparente confiança no sucesso de todas as suas políticas.
Nessa sexta-feira, ele voltou a prometer, num discurso em São Paulo, medidas para conter o crescente desajuste cambial, como se as suas palavras desestimulassem os especuladores.
Não parece haver percebido um fato muito simples: a reação normal dos jogadores a cada nova ameaça é antecipar seu lance e agir mais prontamente que o governo.
Mas o mundo fantástico do ministro tem muitas outras maravilhas.
Segundo ele, "o governo não titubeará em adotar medidas para ter a inflação sob controle".
As autoridades, acrescentou, pretendem evitar o contágio de outros setores pelo aumento dos preços das commodities.
Ele pode não ter notado, mas, no Brasil das pessoas comuns, o contágio há muito deixou de ser um risco hipotético.
Enquanto o ministro discursava em São Paulo, a Fundação Getúlio Vargas divulgava no Rio de Janeiro o Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S), pesquisado em sete capitais.
O aumento foi de 0,89% nos 30 dias terminados em 7 de abril.
Segundo a apuração recém-concluída, o surto inflacionário contaminou 68,33% dos bens e serviços incluídos na pesquisa.
A inflação brasileira, segundo insiste o ministro, é essencialmente um reflexo da valorização internacional dos produtos básicos.
Mas ele decidiu, talvez por segurança, elevar de 1,5% para 3% o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) incidente no crédito ao consumidor.
Desde o ano passado muitos especialistas vinham apontando a rápida expansão do crédito como um fator inflacionário.
A reação do governo foi demorada e muito provavelmente será inócua no combate à inflação.
A maior parte dos consumidores dificilmente notará o aumento do imposto e continuará tomando financiamentos, se as prestações couberem no seu orçamento.
Muito mais eficaz seria uma redução do número das prestações, mas o ministro ou não percebeu esse dado ou não se dispôs a tomar uma providência realmente séria.
O aumento do imposto servirá mesmo para engordar a arrecadação do governo.
Só com o aumento da carga tributária o governo conseguirá alcançar a meta fiscal deste ano - outra promessa do ministro.
Ele mencionou, naturalmente, a disposição do Executivo de cortar parte dos gastos programados para o ano, como se houvesse, de fato, a intenção de executar uma política austera.
Também isso é fantasia.
Já se fala, em Brasília, da disposição do governo de preservar certo volume de desembolsos para atender a pressões de prefeitos preocupados com as eleições de 2012.
Isso é apenas parte das pressões.
Em seu surto de fantasia, o ministro comparou a expansão dos investimentos no Brasil e na China.
A China deve ter investido 55% do PIB no ano passado.
O Brasil precisará poupar muito mais para chegar à metade disso.
Esse resultado dependerá principalmente da adoção de políticas mais sérias pelo governo.
Fantasia sem ação não gera recursos.
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