Ao elogiar Collor, Renan e Sarney, Lula retrocede na história e confirma avaliação inicial do guru da ditadura
José de Souza Martins
*Professor emérito da Faculdade de Filosofia da USP. Autor de Fronteira - A Degradação do Outro nos Confins do Humano
Quem viu as fotografias e leu o noticiário sobre a visita do presidente Luiz Inácio a Palmeira dos Índios, em Alagoas, deve ter estranhado exuberantes elogios (além da carona no Aerolula) ao ex-presidente Collor, extensivos a Renan Calheiros, que teve problemas na presidência do Senado.
A que se pode juntar os elogios e o empenhado apoio que nestes dias deu a José Sarney, presidente do Senado, enrolado na questão dos atos secretos de nomeações para funções naquela casa do Congresso.
O Lula e o PT de hoje são irreconhecíveis em face do que disseram que seriam, no manifesto de fundação do partido, em 1980.
Eles se tornaram interessantes enigmas para a compreensão dos nossos impasses políticos, os de uma história política que avança recuando.
Em discurso de 1980, na Escola Superior de Guerra, o general Golbery do Couto e Silva, militar culto, ideólogo do regime instaurado pelo golpe de Estado de 1964, deu indicações sobre a armação do futuro político do País e do lugar que nele vislumbrara para Lula.
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Dedica umas poucas palavras à "ala esquerdista da Igreja", e é quando cita Lula enquanto membro de uma elite sindical de líderes autênticos, "sem revanchismo ideológico".
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Assim como Golbery, Lula também compreendeu que a Igreja Católica estava dividida em consequência das inovações do Concílio Vaticano II e que nela havia uma importante facção, que ia de leigos a bispos, ansiosa por aliar-se às esquerdas com base no capital político das comunidades eclesiais de base.
A Igreja tinha seus motivos, temerosa de ver-se repudiada por ponderáveis parcelas da população, vitimadas por notórias carências sociais.
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Lula e o PT serão decisivos na demolição da esquerda característica e histórica.
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Lula e o PT cresceram, aglutinando o que nem sempre corretamente se autodefine como esquerda.
O manifesto de 2002, pelo qual o PT realinha suas orientações ideológicas a favor de uma generosa aliança com o capital e com as multinacionais, bem como com os grupos políticos de origem oligárquica, representa o cume na construção de esquerda do partido e o início do processo de sua desconstrução de direita.
Ainda antes das eleições presidenciais daquele ano, Lula, falando a usineiros de açúcar e fornecedores de cana de Pernambuco e da Paraíba, fez a crítica do socialismo e lhes prometeu benefícios de política econômica, o que resultou na imediata adesão de todos a sua candidatura.
Daí em diante, Lula no poder e o próprio PT foram descartando pessoas e facções internas à esquerda de sua opção conservadora.
Foram descartando também as organizações que atuam como movimentos sociais, abandonando ou atenuando programas e projetos.
Inicialmente, para trazer o apoio do latifúndio e do grande capital a sua pessoa e a seu governo.
Depois, para agregar a sua base política o que de mais representativo há do remanescente oligarquismo brasileiro e da obsoleta, e não raro corrupta, dominação patrimonial.
O solidário e empolgado abraço de Lula, com sorrisos, nesses três aliados, emblemáticos senadores da República, é sobretudo um fraterno e decisivo abraço no retrocesso histórico e nos reacionários arcaísmos da política brasileira.
O general Golbery achou que se enganara.
Não se enganou.
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