Melchiades Filho, Folha de S. Paulo
Dilma Rousseff não faz jus à fama de firme e doutrinária nem confirma a expectativa de que realizaria um governo inflexível.
Aos poucos, ela vai se dobrando à realpolitik.
Resistiu por um tempo à fisiologia pura, mas não tardou a abandonar antigas convicções.
Os recuos mais gritantes dizem respeito a um tema caro à presidente "enquanto pessoa física": a radiografia do passado, sobretudo do período de repressão militar.
Como ministra da Casa Civil, a ex-presa política Dilma reclamou a abertura total dos arquivos oficiais e a revisão da Lei da Anistia, para levar à Justiça os crimes comuns (sequestros, estupros) cometidos em nome do Estado na ditadura.
Agora, defende o sigilo dos documentos que o governo considerar sensíveis e joga fora a chance de ajustar a Lei da Anistia -o advogado-geral da União usou argumentação frontalmente contrária à que Dilma esgrimiu, três anos atrás, para pedir a correção histórica.
Erra quem sustenta que são concessões isoladas para reforçar os alicerces do governo, abalados pela inesperada demissão de Antonio Palocci.
Outros recuos precederam a queda do "primeiro-ministro".
Enquanto braço-direito de Lula, Dilma atuou para esvaziar a pauta ambientalista, fritar a colega Marina Silva e explorar o potencial agrícola e energético da Amazônia.
Hoje, preocupada com a imagem no exterior, manifesta contrariedade com o Código Florestal em análise no Congresso -cujos artigos, um a um, retratam o que ela sempre defendeu.
Mais: Marina é convidada ao Planalto como aliada.
O chamego com FHC, atacado impiedosamente na eleição.
A decisão de privatizar os aeroportos, em vez de cumprir os planos de fortalecer a estatal Infraero.
A manobra para ocultar os orçamentos da Copa, meses após ter prometido que toda planilha seria divulgada.
Para os dilmistas, há um só alento.
Quem muda tanto de princípios um dia pode retomar os originais.
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