O Globo - (Editorial)
Em artigo publicado no GLOBO, o correspondente do jornal espanhol “El País”, Juan Arias, expôs sua perplexidade diante da letargia cívica que acomete a sociedade brasileira enquanto se multiplicam casos de corrupção.
O afastamento de dois ministros, Antonio Palocci e Alfredo Nascimento, em poucos meses de governo Dilma, seria motivo para alguma manifestação.
Até porque, antes de serem fatos isolados, constam de um longo ciclo de malfeitos na esfera pública.
É ainda mais estranha a passividade quando se considera — como levou em conta Arias — que este mesmo país já ocupou ruas e praças em defesa da volta das eleições diretas e pelo impeachment, por corrupção, do presidente Fernando Collor.
Nos últimos tempos, apenas atraem multidões, observou o jornalista, a defesa da liberalização da maconha, a luta contra a homofobia e igrejas evangélicas.
“Por que não reagem os brasileiros?” — é o título do artigo de Arias.
O fenômeno da inapetência política diante de assaltos aos cofres abastecidos com pesados impostos pelo contribuinte tem múltiplas raízes.
A mais profunda deriva da bem-sucedida execução de um projeto de cooptação — com dinheiro público, claro — dos sindicatos, organizações da sociedade civil, como a União Nacional dos Estudantes (UNE), e movimentos ditos sociais.
Todos convertidos em correias de transmissão do lulopetismo.
Repartida a máquina pública dentro da filosofia do toma lá dá cá do fisiologismo, couberam ao MST e satélites, por exemplo, o Ministério do Desenvolvimento e o Incra; e aos sindicatos, o Ministério do Trabalho, e por óbvio, respectivas verbas.
Assim, soube o lulopetismo desativar os motores de ignição clássicos de manifestações políticas.
Até o 1º de Maio, data de reivindicações sindicais, foi convertido num dia de quermesses.
Afinal, as agremiações sindicais estão no poder.
Na reedição sem retoques de uma política getulista, o governo Lula oficializou a existência das centrais, dando-lhes a chave do cofre do imposto sindical, um dinheiro de acesso fácil, recolhido compulsoriamente dos assalariados, e sem a necessidade de comprovação de gastos.
Tudo ao contrário do que defendia o “novo sindicalismo” nascido sob a liderança de Lula no final da década de 70.
Também não pode ser desprezado o efeito hipnótico do crescimento econômico com inflação sob relativo controle, embora alta.
Acrescente-se o crédito farto — caro, mas com prestações a perder de vista — e estará pronto o cenário de tranquilidade para os inquilinos do poder.
Não é inédito. Guardadas as devidas diferenças históricas, também no auge do “milagre brasileiro” a classe média não se opôs à ditadura militar, enquanto conseguia comprar no crédito direto o primeiro carro do filho recém-aprovado no vestibular.
Outro aspecto a ser considerado é que, com Lula, a partir de 2003, passou a ser aplicado um projeto de poder, não de governo.
Em nome dele, tudo é válido — mensalões, aloprados, getulização do Estado, doação do Ministério dos Transportes ao PR e a Valdemar Costa Neto.
O silêncio literalmente vale ouro.
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