Elio Gaspari, O Globo
Durante a campanha eleitoral, Dilma Rousseff prometeu regulamentar, "logo no início do mandato", a emenda constitucional que demarca os recursos destinados à saúde pública.
Prometeu também não patrocinar aumentos da carga tributária.
Passaram-se oito meses e apareceu uma nova agenda.
Enquanto obstrui a votação da Emenda 29, o Planalto pede ao Congresso um debate para que se busquem novas fontes de financiamento para a saúde.
Há três ideias em circulação: uma aumenta a carga de impostos, recriando a CPMF; outra incentiva a tavolagem, legalizando os bingos; e a terceira busca o dinheiro nos royalties do petróleo.
Como sempre, a solução para um problema, seja ele qual for, está em engordar a caixa do palácio.
No mesmo dia, a presidente mostrou que acredita na onipotência das canetadas.
O exemplo disso está na nova legislação que altera o mecanismo de ressarcimento, ao SUS, do que ele gasta com clientes dos planos de saúde.
Nela, a boa ideia é cobrar pelos atendimentos ambulatoriais e por alguns procedimentos custosos.
A má é trocar o destinatário do ressarcimento.
Em vez de o dinheiro ir (em tese) para quem cuidou do paciente, irá para a os comissários de Brasília que controlam o Fundo Nacional de Saúde.
Numa conta da Controladoria Geral da União de janeiro passado, os repasses irregulares do FNS iam a R$ 663 milhões.
Em vez de se discutir o fracasso da Agência Nacional de Saúde, que em 2010 empulhou a patuleia anunciando um novo sistema de cobrança quando nem sistema havia em operação, oferece-se uma nova visão do paraíso.
Entre 2006 e 2010 a Agência recebeu das operadoras R$ 37,7 milhões.
A estrutura burocrática da cobrança custou mais que o valor arrecadado.
Os brasileiros acompanharam com mais detalhes o debate da saúde pública na administração de Barack Obama do que nos governos de Lula e Dilma.
Numa vinheta ilustrativa dos interesses privados nesse silêncio, vale lembrar que, na galeria dos 30 bilionários nativos listados pela revista "Forbes", entraram, com US$ 3,9 bilhões, dois controladores da Amil.
Noutra cena, há uns dias o presidente da Câmara, Marco Maia, voou de favor num helicóptero e num avião da Uniair, empresa da operadora Unimed.
A bancada dos planos de saúde no Congresso senta-se, majoritariamente, na base de apoio do Planalto.
A repórter Beth Koike mostrou que, entre 2000 e 2009, o número de clientes dos convênios médicos cresceu 40%, atingindo 42 milhões de pessoas.
Segundo o IBGE, entre 1999 e 2009 o número de leitos oferecidos pela rede privada encolheu 18%.
Foram fechados 400 hospitais, com 11 mil leitos.
O sistema de financiamento da saúde pública brasileira está bichado.
Esse debate ultrapassa, de muito, a simples discussão da Emenda 29 ou a busca de novas fontes de arrecadação.
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