O Globo (Editorial)
O feriado do Dia da Independência se tornou um marco na história das manifestações populares no país.
Menos pela quantidade de pessoas que levou às ruas, e muito mais pela forma e contexto em que foram mobilizadas.
Fica registrado que em 7 de setembro de 2011 alguns milhares de brasileiros decidiram protestar contra a onda de corrupção na esfera pública, sem atender qualquer das entidades outrora de praxe — UNE, sindicatos —, apenas conectando- se por meio de redes sociais, via internet.
Aliás, decidiram fazer o que fizeram contra os interesses de UNE, sindicatos etc.
Este tipo de mobilização política espontânea entre cidadãos, à margem de governo, partidos e corporações, ganhou grande destaque mundial na luta (frustrada) da oposição iraniana contra a vitória eleitoral fraudada de Ahmadinejad, em 2009.
(...)
A peculiaridade brasileira é que desde 2003, com a chegada de Lula ao Planalto, entidades estudantis, organizações ditas sociais como o MST e grandes centrais sindicais (CUT e Força) — apenas para citar os elos mais importantes desta cadeia fisiológica — passaram a ter assento no grande banquete pago pelo dinheiro do Tesouro Nacional (leia-se, o contribuinte).
Na política de obter apoio em troca de vagas e verbas, o governo doou o Incra ao MST, o Ministério do Trabalho aos sindicatos, encheu os cofres da UNE de numerário, e, assim, chegamos ao ponto atual, em que, por conveniências bastante concretas, aguerridas entidades fingem que não há corrupção em Brasília.
Tampouco que a multiplicação de casos em que o Tesouro é assaltado deriva do toma lá dá cá adotado em Brasília há oito anos.
Forjou-se, até, a anedótica comparação entre os que pedem hoje lisura no manejo do dinheiro do Erário com a UDN de Carlos Lacerda, da década de 50, na campanha contra Vargas, acusado de corrupção.
Os momentos históricos são distintos como água e vinho.
No fundo, paira a visão de que o roubo de direita tem de ser denunciado, enquanto o roubo de esquerda deve ser tolerado, em nome da “causa”. Lamentável.
A mobilização que resultou nas quase 30 mil pessoas no asfalto de Brasília, sem que fossem admitidas faixas e cartazes alusivos a partidos, pode ser a ponta de algo maior existente no subsolo da sociedade.
Merece alguma reflexão dos atuais donos do poder.
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