Por José Serra
A crítica ao loteamento político desenfreado dos cargos federais foi um ponto que repisei bastante na última campanha eleitoral.
A necessidade de alianças para obter maioria parlamentar acabou gerando no Brasil um desdobramento nefasto: a partilha da máquina estatal por grupos políticos interessados apenas em se servir dela, e não em servir ao povo.
O caso do Ministério do Esporte foi o mais recente e emblemático.
Dia após dia, as notícias brotaram, trazendo exemplos de iniciativas nas áreas que receberam o dinheiro, mas nada fizeram.
Ou fizeram muito menos do que os recursos permitiriam fazer.
O problema não é monopólio de um partido ou de uma orientação ideológica.
Da direita à esquerda, passando pelo centro e também por quem não chega a ter ideologia, a coisa se repete como um script pré-ensaiado.
A turma instala-se na máquina e passa a ordenhá-la em benefício próprio.
A versão supostamente benigna diz que é para turbinar campanhas eleitorais, mas será legítimo desconfiar.
É provável, como, aliás, o noticiário também começou a mostrar, que os desvios de conduta estejam a abastecer o patrimônio privado dos envolvidos.
Ou, então, talvez estejamos diante de um modelo misto.
Uma parte para a legenda e outra para quem coloca a mão na massa.
Mas, se o problema não está localizado numa sigla, ou num ponto do espectro ideológico, onde estará?
A resposta é simples: na atitude de quem governa.
As pressões são parte da política, mas ceder a elas e dar até o mau exemplo não é uma fatalidade.
O governante tem margem de escolha, pode fazer ou não fazer.
O partido pedir um ministério “de porteira fechada” é do jogo, mas quem governa deve ter força e convicções para conseguir dizer “não”.
E vejam bem: daria na mesma se, em vez da porteira fechada para um partido, se dividisse cada ministério ou empresa estatal entre vários partidos e subgrupos, como, aliás, é feito na Petrobrás e na área elétrica do governo.
O presidencialismo de coalizão não é fenômeno recente no Brasil. Foi suspenso durante o regime militar e voltou com força plena desde a redemocratização, especialmente depois da Constituinte. A pulverização partidária obriga.
Mas, infelizmente, os últimos anos mostram que o sistema degenerou, degradou-se por força de circunstâncias político-policiais.
Especialmente no governo anterior a este, período no qual governabilidade acabou se tornando sinônimo de reunir apoio para abafar escândalos.
Mas a nova presidente não estava obrigada a prosseguir na mesma toada.
E para alguns, o início do governo parecia começar a acenar com uma diferença.
Houve quem apostasse num esforço para promover cirurgias em pontos críticos da máquina, drenar abcessos, acabar com a “porteira fechada”.
Segundo os portadores dessa boa vontade, isso seria natural, pois a presidente precisava mostrar capacidade de comando, alguma ascendência sobre uma administração praticamente organizada pelo antecessor.
Mas, agora, no caso do Ministério do Esporte, evidenciou-se a fraqueza dessa tese. Precisou o STF agir para que o Planalto se mexesse.
(continua)
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