Dora Kramer
O raciocínio desenvolvido pela presidente Dilma Rousseff sobre os recentes conflitos com o Congresso, em sua entrevista à revista Veja, é institucionalmente irretocável."Perder ou ganhar votações faz parte do processo democrático. Você não pode ganhar todas (blablabla)....
Infeliz, porém, apresenta-se a realidade em que a teoria não rende homenagens à prática. Nos atos Dilma contradiz as próprias palavras quando deixa transparecer que em seu modo de operação a única possibilidade de expressão do Parlamento é dizer "sim" a tudo que emana do Palácio do Planalto. Ou, então, o que pensa a presidente não é o que dizem nem o que fazem seus Auxiliares.
Se o caso for de erro de tradução, as coisas podem muito bem se ajeitar. Começando por Dilma mandar que parem de usar expressões como "faca no pescoço", de dizer que ficou "irritada" com isso ou "furiosa" com aquilo e que não vai admitir ser contrariada em votações.
Mas, se a discrepância for entre o discurso eventual e a prática cotidiana da presidente, complica. A realidade é exatamente aquela descrita por ela na entrevista: a despeito da fragilidade do Legislativo - gerada por uma deformação de conduta, é verdade - o Executivo não pode se valer dela para sobressair-se junto à opinião pública nem para estabelecer uma conexão baseada na intimidação, na lógica da luta do bem contra o mal.
Entre outros motivos porque denota deliberada aposta no desequilíbrio entre os Poderes. E por mais que o grosso da opinião pública não entenda direito o significado disso, cabe ao governante evitar cair na tentação de jogar na confrontação entre políticos e sociedade.
A se exacerbarem os ânimos nessa direção, amanhã ou depois aparecem os pregadores da inutilidade do Congresso e, a depender de como esteja o clima, pode prosperar um ambiente que não interessa a ninguém. Nem aos atuais condôminos do poder.
A presidente Foi à Índia. Ficará ausente por uma semana. Nesse período haverá tempo para conferir se a ela se aplica a frase do então senador Fernando Henrique Cardoso quando José Sarney era presidente - "A crise viajou" - ou se a confusão toda decorre de uma enorme falha de comunicação.
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