Dora Kramer
A revelação de que o senador Demóstenes Torres conjugava o combate a ilicitudes em público com atividades ilícitas em privado ao servir de estafeta para notório contraventor provocou reações de desalento, decepção e também de regozijo.
Abatidos ficaram os que acusaram um duro golpe na já combalida oposição; desapontados os que tinham nele uma referência de ética na política; exultantes mostraram-se aqueles que viram no episódio a chance de externar uma espécie de vingança à deriva contra "os moralistas de plantão".
Para estes, Demóstenes Torres é a prova cabal de que os combatentes das boas causas devem ser vistos com desconfiança, pois dentro deles mora sempre um amoral. "São os piores", avisam sapientes.
O problema da premissa é o equívoco da tese: se as farinhas todas têm origem no mesmo saco, que se locupletem todos à vontade. Tudo estaria então permitido e a crítica antecipadamente interditada em obediência ao pressuposto da isonomia no quesito suspeição.
(...)
Mesmo antes da divulgação das conversas telefônicas gravadas pela Polícia Federal ao longo da Operação Monte Carlo, o Brasil todo conhecia o dito empresário de jogos do vídeo protagonizado por ele e Waldomiro Diniz em ato de oferta de propina ao custo de traficância de influência. Hoje um está preso e outro condenado.
Foi o primeiro escândalo do governo Lula (2004) e a primeira vez que o País teve contato (em caráter nacional) com a discrepância entre o discurso ético e as práticas pouco éticas do partido.
Provocou uma quebra de expectativas. Guardadas as proporções, mais ou menos o ocorrido agora em relação a Demóstenes Torres.
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Outros já fizeram coisa igual ou pior e estão por aí. O que não pode ser visto como justificativa, a menos que se aceite cair na armadilha pusilânime do "todo mundo faz".
Demóstenes Torres qualificou o mandato com várias ações, entre as quais sua participação na aprovação da Lei da Ficha Limpa, mas o desqualificou ao levar vida dupla.
Não poderá contar com a mesma condescendência dos que se safaram de episódios tão indefensáveis quanto porque não tem quem o defenda: nem partido, nem presidente da República, nem a corporação. Está só.
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