O Globo (Editorial)
Uma questão de fundo técnico, a
formação das taxas de juros no mercado, resvala para um embate político
entre governo e bancos, inclusive com arroubos mais adequados a
palanques eleitorais.
Não se tinha notícia, antes do último
Primeiro de Maio, de o tema frequentar discurso presidencial no Dia do
Trabalhador. Pois aconteceu, com a presidente Dilma, em cadeia nacional,
acusando a “lógica perversa” do sistema financeiro nacional, por não
acompanhar em seus guichês a proporção da queda da taxa de juros básica
(Selic).
O problema existe e se deve aos elevados spreads
praticados pelos bancos no Brasil — a diferença entre quanto a
instituição financeira remunera o investidor ao captar dinheiro e os
juros cobrados, na outra ponta, ao tomador de empréstimo.
A
distorção gera desalinhamentos escandalosos: enquanto a inflação anual é
menos de 6% e a Selic se encontra em 9%, há modalidades de crédito que
subtraem do orçamento do credor mais de 10% ao mês — se ele estiver
financiando compras pelo cartão de crédito, por exemplo.
Convertida
a questão dos juros em algo como uma cruzada — o que não é mau, a
depender das armas utilizadas —, o governo acionou os dois grandes
bancos estatais com atuação no varejo, BB e Caixa, para cortar spreads e
jogar taxas para baixo. Bom estímulo à competição, embora a tal
portabilidade entre bancos seja pouco usada pela clientela.
Está
no campo de ação da presidente mandar os bancos oficiais reduzir custos
de crédito. Mas, se isso gerar prejuízos às instituições oficiais, a
conta deverá ser paga, em algum momento, pelo contribuinte, por meio de
aportes de capital do Tesouro ao BB e à CEF.
Isso já ocorre na injeção
de recursos no BNDES pela perigosa via da ampliação do endividamento
público.
Os bancos alegam, com razão, haver obstáculos concretos
para a aceleração da queda das taxas efetivas. É preciso compensar a
inadimplência, por exemplo. A presidente diz, também com razão, que o
Brasil precisa ter juros nos níveis internacionais.
Mas, ao
contrário do mundo exterior, só no Brasil existe a exigência de os
bancos manterem volumosos depósitos no BC e uma carga tributária pesada
sobre transações financeiras.
Há, ainda, no sistema financeiro uma
grande parcela de crédito subsidiado — BNDES, agrícola etc. —, que não
só reduz a eficácia da política monetária (juros) como trava a oferta,
em mais um fator de manutenção de taxas elevadas no mercado.
O
assunto é complexo e não poderá ser resolvido “no grito”. Não são boas
as relações entre o governo e os bancos, representados pela Febraban.
Mas a troca de frases cáusticas de lado a lado nada produz de objetivo.
Ganhariam
todos se medidas concretas fossem tomadas para eliminar os obstáculos à
queda dos spreads e houvesse ações para estimular a concorrência no
setor bancário, atividade muito concentrada (80% do mercado estão com
dez grupos).
O Planalto pode aumentar ainda mais a popularidade
numa “guerra” contra os bancos auxiliado por marqueteiros. Mas será
inócuo. Apenas repetirá o equívoco observado em certos países
latino-americanos em que assuntos intrincados são tratados em meio a
jargões inflamados em praça pública.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário