O julgamento do Mensalão, que começa daqui a cinco dias, ainda que não dê em nada (como receia boa parte da população), já é um revés considerável para a imagem do PT e do ex-presidente Lula.
A transmissão direta pela TV confere às sessões do Supremo Tribunal Federal contornos de espetáculo político, a condicionar e moldar o comportamento de juízes, advogados e promotores.
Cada qual, mesmo escondendo-se atrás de uma linguagem cifrada, o juridiquês, sabe que está sendo visto e avaliado por milhões de espectadores. A mídia se encarrega de traduzir o que cada qual diz e a oposição reverbera os aspectos mais negativos.
Em ano de eleição, isso é trágico, o que explica o empenho frustrado de Lula em procurar ministros do STF em busca de adiamento, que levaria à prescrição de boa parte das acusações.
Lula, embora não seja réu, é personagem central de toda essa história, seja porque ocorreu em seu governo, seja porque a negou, seja porque é acusado de ser o seu mentor – ou por tudo isso somado.
Embora tenha indicado nada menos que sete dos onze ministros – incluindo um ex-advogado do PT, José Antonio Toffoli, e um amigo da família, o relator revisor Ricardo Lewandowski -, não tem qualquer segurança de que os trabalhos serão conduzidos favoravelmente.
O fator imponderável chama-se opinião pública. Lewandowski, por exemplo, teve que acelerar seu relatório em face das pressões que recebeu dos próprios colegas de tribunal. Havia dito, mais de uma vez, que não tinha pressa para concluí-lo. Chegou a cogitar de entregá-lo no ano que vem, mas acabou cedendo às reações.
Além dos casos pontuais que serão examinados, estará em jogo o caráter bipolar do PT, que surgiu e se firmou como uma espécie de vestal da política brasileira, fiscal da moral alheia e que, ao chegar ao poder, transformou-se no seu antípoda, levando ao paroxismo as piores tradições da vida pública brasileira: alianças espúrias, aparelhamento do Estado, corrupção ativa e passiva. O Mensalão é a síntese desse comportamento.
Há quem argumente que, se ao tempo em que foi denunciado, o Mensalão não impediu que Lula se reelegesse, por que agora faria diferença? Simples: Lula foi então beneficiário de dois fatores convergentes: de um lado, o temor de envolvê-lo e provocar turbulências sociais (Roberto Jefferson, o denunciante, o proclamou inocente); de outro, o boom econômico e a febre de consumo que estimulou.
A esses fatores, se agregou a avaliação equivocada da oposição de que Lula sangraria em público e que até um poste o derrotaria nas eleições. Era o que proclamava na época o senador Antonio Carlos Magalhães, que procurou o então presidente da OAB, Roberto Busato, pedindo-lhe que não encaminhasse à Câmara dos Deputados o processo de impeachment. O Conselho Federal da OAB acatou o pedido.
Hoje, o quadro é outro. A economia já não está em alta e os denunciantes, como Roberto Jefferson, não hesitam em atribuir a Lula o comando do Mensalão. Podem até não dispor de provas que o levem às barras da Justiça, mas o expõem a um desgaste incontornável, na medida em que há verossimilhança na acusação.
Como poderia Lula, que dirige o PT com mão de ferro desde sua fundação, ignorar operações de tal magnitude?
Não bastasse, José Dirceu, apontado pelo procurador geral da República, Antonio Fernando de Souza, como “chefe da organização criminosa”, disse mais de uma vez que tudo o que fez foi com “o conhecimento e o consentimento do presidente”.
Essas e outras declarações serão relembradas ao longo das sucessivas sessões do STF, nos discursos da tribuna do Congresso e nos inevitáveis replays que infestarão as TVs e a internet.
Ainda que as figuras maiores do PT sejam absolvidas, não escaparão do desgaste que essa história lhes impõe. A presidente Dilma, ciente disso, mantém prudente distância do problema, ainda que, de forma indireta, tenha sido dele beneficiária
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