Pequenas notas em alguns jornais deixaram escapar a informação de que a missão de chanceleres sul-americanos, que desembarcou em Assunção no dia em que o Congresso iniciou o julgamento do ex-presidente do Paraguai, Fernando Lugo, teve efeito inverso ao esperado.
Com medo de que a interferência de outros países acabasse por inviabilizar o impeachment, deputados e senadores paraguaios aceleraram o processo. Temiam uma guerra civil de consequências imprevisíveis.
Na quinta-feira 21, dia em que souberam da ida de representantes da Unasul para o País, os parlamentares paraguaios decidiram não acatar o pedido de Lugo de abrir um prazo de três dias para apresentar sua defesa. Ficou estipulado o prazo de 24 horas. Ou seja, a ação precipitou o julgamento de Lugo, que incitava, com apoio de parceiros dos países vizinhos, uma reação da população em sua defesa. E desse tipo de manifestação se espera, com razão, muita truculência.
Mais uma vez, o jornalista Elio Gaspari relembra fato semelhante ocorrido tempos atrás, com resultados muito mais satisfatórios porque a liderança do presidente da República à época, aliada à tradicional competência da diplomacia brasileira, equivocada nos últimos tempos, fez a diferença.
Dilma deveria pedir uma aula a FH, por Elio Gaspari
Elio Gaspari, O Globo
A doutora Dilma e o chanceler Antonio Patriota deveriam revisitar a estudantada em que se meteram no Paraguai, comparando os próprios erros com outro episódio, ocorrido em 1996, quando as coisas deram certo, sem espetáculo.
Durante as festividades da Rio+20, Dilma e Patriota souberam que a Câmara dos Deputados aprovara a abertura do processo de impedimento do presidente Fernando Lugo por 76 votos a um. O doutor foi mandado ao Paraguai numa comitiva da Unasul para recolocar a pasta de dentes no tubo. A embaixada do Brasil em Assunção já advertira o governo, há semanas, a respeito da gravidade da situação. Fizeram o quê? Nada.
Havia o que fazer? Em abril de 1996, o presidente Juan Carlos Wasmozy soube que o comandante do Exército, Lino Oviedo, pretendia derrubá-lo.
Pediu apoio ao Brasil, e o embaixador Márcio Dias disse-lhe que Fernando Henrique Cardoso não concordaria com um golpe. Era pouco. Ele queria ouvir isso pessoalmente. O diplomata combinou que Wasmozy iria a Brasília (pilotando seu avião), seria recebido no aeroporto pelo chanceler Sebastião do Rego Barros (dirigindo seu próprio carro) e seguiria para o Palácio da Alvorada.
Conversou com FH e retornou durante a madrugada. O presidente brasileiro entrou em contato com seu colega Bill Clinton, e ele telefonou para Wasmozy dizendo-lhe que, em caso de ameaça, deveria ir para a embaixada americana.
Dias depois, Oviedo deu um ultimato a Wasmozy, anunciando que atacaria o palácio ao amanhecer. O presidente paraguaio foi para a embaixada americana com o ato de renúncia redigido. Lá estava o embaixador Márcio Dias, que o rasgou. (Wasmozy guardou o picadinho.) O dia amanheceu, e o golpe evaporou-se.
Dias depois, Oviedo deu um ultimato a Wasmozy, anunciando que atacaria o palácio ao amanhecer. O presidente paraguaio foi para a embaixada americana com o ato de renúncia redigido. Lá estava o embaixador Márcio Dias, que o rasgou. (Wasmozy guardou o picadinho.) O dia amanheceu, e o golpe evaporou-se.
Tudo isso aconteceu sem holofotes ou estudantadas de um multilateralismo que no caso da patrulha dos chanceleres da Unasul serviu apenas para colocar o Brasil a reboque de uma política de ameaças inócuas.
Uma diplomacia profissional, a americana, falou o mínimo possível. Resultado: a doutora Dilma e seus companheiros fizeram a empada, compraram a azeitona, deram o mimo aos americanos e ficaram com o caroço.
Como dizia o chanceler Azeredo da Silveira, atravessaram a rua para escorregar na casca de banana que estava na outra calçada.
A diplomacia multilateral faz espetáculos, arma consensos e, geralmente, dá em nada. A bilateral, como a do Brasil no Paraguai em 1996, dá trabalho.
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