Dora Kramer, O Estado de S.Paulo
João
Santana, o marqueteiro das estrelas, é um exímio construtor de mitos.
Não o único, porque não se pode deixar de lado o papel de Duda Mendonça
na arquitetura do "novo" Lula que ganhou a eleição presidencial de 2002
depois de perder três.
Mas Santana é mais sofisticado, analítico,
menos intuitivo. Maneja emoções como ninguém. É um ás no ofício de
transformar percepções difusas em cenários reais.
Em outras palavras: sabe levar as pessoas a ver as coisas como quer que sejam vistas.
Ciente
desse talento, uma vez até revelou de público seu processo de criação.
Foi em 2006, depois da espetacular reeleição de Lula em meio a
escândalos que teriam derrubado qualquer um - mensalão e aloprados, para
citar apenas dois -, numa entrevista ao jornalista Fernando Rodrigues,
da Folha de S.Paulo.
Atribuiu em grande parte a vitória ao
desenvolvimento da teoria do "fortão" e do "fraquinho": uma figura dupla
de fácil identificação no imaginário popular. O primeiro encarnaria o
humilde que virou poderoso e o segundo faria às vezes de vítima do
preconceito das elites.
Nas palavras de Santana, depois que se
elegeu em 2002, Lula passou a representar para os mais pobres uma
projeção de sucesso. "É um deles e chegou lá". O "fortão", que rompe
barreiras.
"Mas, quando Lula é atacado, o povão pensa que é um ato
das elites para derrubar o homem do povo só porque é pobre". Nessa
hora, dizia o marqueteiro, "vira o bom e frágil que precisa ser amparado
e protegido".
Sobre
a figuração preparada para Dilma Rousseff, João Santana não teorizou em
entrevistas, mas não é difícil perceber que tipo de mito constrói a
presidente durona, trabalhadora, intolerante com "malfeitos", resistente
a negociatas políticas, estadista que não mistura atos de governo com
questões partidárias, muito menos eleitorais.
Deu certo. Dilma com
isso agradou aos setores que renegavam os métodos de Lula sem perder
apoio nas camadas encantadas com o "fortão" e o "fraquinho".
O problema é que as agruras penais, políticas e eleitorais do PT
estão levando Dilma a descer do pedestal. Obrigam-na, por exemplo, a ir
ao horário eleitoral prometer ao eleitor benefícios em troca de votos
para seus correligionários.
Vantagem tão indevida quanto usar ministérios como moeda eleitoral ou
fazer discurso de palanque no espaço de comunicação da Presidência da
República em data nacional.
E quando a fábula afronta tão completamente a realidade, não há talento que esconda do mito os pés de barro.
Leia mais em Pés de barro
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário