Os erros das pesquisas de intenção de voto, o número recorde dos que não votaram em ninguém e a arrogância
Por Reinaldo Azevedo
Houve uma abstenção inédita em São Paulo, como todo mundo sabe: 19,99% dos que podiam votar simplesmente não compareceram às urnas no segundo turno. Somados aos que votaram em branco (4,34%) e aos que anularam o seu voto (7,26%) — e hoje ninguém mais anula sem querer —, tem-se a soma fabulosa de 31,59%. De um eleitorado composto de 8.619.170, nada menos de 2.722.795 pessoas preferiram não votar em ninguém: ou não compareceram às urnas (a maioria), ou disseram que tanto fazia um como outro (a minoria do grupo) ou que nem um nem outro (o grupo intermediário). Muito bem. Dito isso, avancemos um pouco com outro dado.
Computadas as urnas, Serra obteve 44,43% dos votos válidos, contra 55,57% de Fernando Haddad, uma diferença de 11,14 pontos percentuais. No dia da eleição, o Estadão estampou a pesquisa Ibope, com margem de erro de três pontos para mais ou para menos: o petista venceria o tucano por 59% a 41%.
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Atenção! Quatro dias antes do pleito, no dia 24, o Datafolha havia apontado uma diferença de nada menos de 20 pontos nos votos válidos — quase o dobro daquela que se viu de fato.
Desmotivação e abstenção
Escrevi ontem que certa desordem partidária — ideológica e conceitual também — provocada pelo fator Kassab certamente responde por boa parte daquelas quase 32% que preferiram não escolher ninguém. Os motivos estão lá expostos. Não vou repisar argumentos. Mas é claro que não pesou só esse elemento.
Ora, quando jornais afirmam, a quatro dias da eleição, que há uma diferença de enormes 20 pontos entre os candidatos, tenho como certo que provocam também a deserção de muitos eleitores do candidato que será fatalmente derrotado. Muitos se perguntaram — e eu mesmo ouvi essa indagação retórica de quem preferiu usar o domingo para passear:
“Votar pra quê? Já está decidido mesmo!”
Os institutos têm as tais margens de erro justamente para acomodar a possibilidade do… erro! Se as extrapolam, alguma explicação tem de ser dada. Mas não se viu uma só — nem no primeiro nem no segundo turnos. Mais: quando um candidato é beneficiado pela extrapolação do limite superior, e o outro, prejudicado pelo rompimento do limite inferior, outra explicação tem de ser dada. E só se ouviu mesmo o silêncio.
O erro de São Paulo não foi o único, mas pode ter sido o mais importante. Não é segredo pra ninguém que pesquisas ruins disparam uma espiral de eventos negativas: há desmobilização de militantes, fuga de apoiadores, bate-bocas internos, jogo de empurra para saber quem está errando mais etc.
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Arrogância
Não estou dizendo, porque não acho isto, que os institutos decidiram a derrota de Serra. O fator decisivo foi a gestão Kassab — que já começou a ser reabraçada pelo petismo a partir desta segunda-feira; afinal, como afirmou Rui Falcão, o prefeito, agora, é um aliado… Mas estou afirmando, sim, que erros dessa magnitude podem ter interferido no resultado de maneira importante.
Não obstante, notem que os institutos acham que não têm rigorosamente nada a dizer. Acham que não têm explicações a dar. Ser dono de um instituto de pesquisa, nessas condições, sem o compromisso do acerto, passa a ser um bom negócio. A minha sugestão para os que se aventurarem na área é regular seus números — mesmo sem ter entrevistado ninguém — pela margem de erro dos figurões do setor. Um diz que o sujeito terá 34 pontos, com margem de erro de dois para mais ou para menos? Chute 33 e estabeleça margem de erro de três… Tende a dar certo. Se o número do que serviu de referência estiver estupidamente errado, o neófito que deu o truque estará em boa companhia…
Pesquisas são instrumentos de medição privados. Pesquisas eleitorais, no entanto, dizem respeito à coisa pública, ainda que feitas por particulares. Continuaremos a fingir que tudo se deu de acordo com os conformes?
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