sábado, 17 de novembro de 2012

DUAS MEDIDAS

Merval Pereira, O Globo

A revelação de que o ministro Dias Toffolli há dois anos condenou o deputado Natan Donadon, do PMDB de Rondônia, a penas tão duras quanto as que estão sendo dadas hoje pelo Supremo para os réus do mensalão joga por terra seu discurso, que agora se prova oportunista e demagógico, contra a pena de privação de liberdade para crimes que não sejam de sangue.

Diante de seu voto anterior, ficou claro que seu discurso alegadamente humanitário tinha só um objetivo: defender que os réus do mensalão não fossem condenados à cadeia.

Da mesma maneira, a fala do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, dizendo que preferiria morrer a ter que passar muito tempo nas cadeias “medievais” brasileiras trouxe à tona sua atuação há dois anos no ministério sem que tenha feito nada a respeito do problema, que, se certamente não é culpa apenas dos governos petistas, estes não o enfrentaram devidamente.

Os jornais e revistas trouxeram fartas informações mostrando que as verbas alocadas para o sistema penitenciário quase não foram utilizadas no que cabia ao governo federal.

Note-se que Toffolli era o revisor daquele processo, fazendo o papel que no mensalão ficou com Ricardo Lewandowski. Ele reduziu a pena proposta pela relatora Cármen Lúcia, mas na dosimetria foi mais rigoroso do que Joaquim Barbosa no mensalão: começou usando a pena-base de cinco anos e daí foi acrescentando todos os agravantes cabíveis, chegando a uma pena final de 11 anos, um mês e dez dias.

E o crime do deputado peemedebista ocorreu em uma Assembleia Legislativa, sem o caráter nacional dos crimes do mensalão e sem as implicações políticas de ataque à democracia registradas pela maioria dos ministros do STF na Ação Penal 470.

Naquele caso, sim, os crimes foram cometidos por questões pecuniárias, mas não se ouviu uma palavra do revisor daquele processo em defesa de penas alternativas. Essa parte do discurso de Toffolli, por sinal, provocou irritação em vastas camadas da opinião pública, pois a pena pecuniária para crimes de desvio de dinheiro público poderia, ao contrário de prevenir, estimular a corrupção.
O risco único seria o de ter que devolver o dinheiro, caso o agente corrupto fosse apanhado. O ministro tem razão ao dizer que a devolução do dinheiro aos cofres públicos seria medida exemplar e pedagógica, mas ela não deve prescindir da punição do agente público autor do desvio.
Aliás, em alguns países, em casos de corrupção, os funcionários públicos recebem penas maiores. A contradição entre seus atos e seu discurso só fez aumentar na opinião pública a percepção de que Dias Toffolli atuou no julgamento do mensalão para favorecer especialmente o ex-ministro José Dirceu, com quem trabalhou na Casa Civil.
Leia a íntegra em Duas medidas

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