Maquiagem de R$ 200 bi garante meta de superávit do governo
- Sem artifícios contábeis, despesas primárias poderiam chegar a R$ 1 trilhão em 2012
- Malabarismo fiscal preocupa mercado financeiro e investidores
VIVIAN OSWALD
GABRIELA VALENTE
O GLOBO
Se o Brasil está muito longe do abismo fiscal que os EUA chegaram a ver de perto, algumas fissuras começam a surgir. Malabarismos contábeis e os novos rumos das contas públicas despertam desconfiança e já preocupam o mercado financeiro e investidores.
As despesas primárias (que não consideram gastos com juros) flertam com a cifra inédita do trilhão. Segundo o especialista em contas públicas do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea) Mansueto Almeida, sem os artifícios contábeis, essas despesas, que devem fechar 2012 próximas de R$ 800 bilhões, já poderiam ter batido R$ 1 trilhão. Ou seja, cerca de R$ 200 bilhões mais altas.
Mesmo assim, o Executivo ainda precisou lançar mão do abatimento de R$ 25 bilhões a que tem direito com gastos em investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para poder cumprir a meta de superávit primário (economia feita pelo governo para pagar juros) de 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos pleo país) prevista para 2012.
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Responsabilidade fiscal sob risco
Outro mecanismo usado pelo governo, que compõe o arsenal que os especialistas vêm chamando de contabilidade criativa, é o uso dos lucros dos bancos públicos e os dividendos pagos pelas estatais para engordar o caixa do Tesouro Nacional. Se as capitalizações não são computadas como despesas, estas duas rubricas são registradas como receitas primárias. Ou seja, o governo empresta sem caracterizar despesas e recebe de volta como receita. Para fechar a conta ano passado, o governo chegou a antecipar o pagamento de dividendos do BNDES e da Caixa Econômica ao Tesouro Nacional.
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O governo enviou ao Congresso Nacional no último dia do ano passado um projeto que permite novos gastos com desonerações fiscais que não estão previstas no Orçamento, desde que as receitas públicas sejam maiores do que o esperado. Neste caso, elas não precisam ser submetidas aos parlamentares como seria de praxe. A medida é vista com desconfiança por analistas, que veem risco a um dos princípios fundamentais da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
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O governo enviou ao Congresso Nacional no último dia do ano passado um projeto que permite novos gastos com desonerações fiscais que não estão previstas no Orçamento, desde que as receitas públicas sejam maiores do que o esperado. Neste caso, elas não precisam ser submetidas aos parlamentares como seria de praxe. A medida é vista com desconfiança por analistas, que veem risco a um dos princípios fundamentais da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
O que mais preocupa estes especialistas é a falta de transparência do governo para lidar com as contas públicas.
Para o especialista José Roberto Affonso, ao usar artifícios fiscais, o governo mina a credibilidade que levou anos para conquistar junto a mercado e investidores.
Para o especialista José Roberto Affonso, ao usar artifícios fiscais, o governo mina a credibilidade que levou anos para conquistar junto a mercado e investidores.
— Não está proibido na LRF reduzir a meta de superávit em períodos de crise, ou até mesmo, fazer um saldo negativo, o que seria mais do que justificável em anos de crise. O que não pode é tentar negar que está fazendo malabarismo fiscal quando todos estão vendo — disse Affonso.
— Trata-se de um expansionismo envergonhado, porque ninguém admite publicamente que está aumentando as despesas e que isso terá um impacto sobre o resto da economia num futuro não distante — acrescenta Felipe Salto, especialista em contas públicas da Tendências.
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