quinta-feira, 9 de maio de 2013

OS ÓRFÃOS DA IMPUNIDADE

Mais um menor para o berçário de Maria do Rosário, Gilberto Carvalho e José Eduardo Cardozo. Ou: Petistas e tucanos odeiam o fato de as vítimas terem cara e serem de verdade!

Reinaldo Azevedo
Pois é… Vamos ter de mandar mais um menor para o berçário de Maria do Rosário, de Gilberto Carvalho, de José Eduardo Cardozo. 
O rapaz que assaltou um ônibus e estuprou uma mulher no Rio também é menor de idade. Tem 16 anos. Não pode publicar o nome dele não. Menores que invadem ônibus e estupram mulheres são protegidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. 
A imagem dele, agora, só pode ser publicada desfocada. É que menores que assaltam ônibus e estupram mulheres são protegidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. 
O Estatuto protege também os menores que estouram os miolos de estudantes em frente de casa. O Estatuto protege também os menores que põem fogo em dentistas. 
Os ongueiros, que não andam de ônibus, não moram na periferia de São Paulo nem têm um consultórios para gente pobre em São Bernardo reprovam este estilo, que vai coordenando casos, exemplificando. Os ongueiros e nefelibatas gostam de tratar as vítimas como abstrações. 
Por isso a capa da VEJA desta semana é tão importante. A capa da VEJA desta semana, como diria o poeta, expõe a “carnadura concreta” das vítimas.(...)
 


















As vítimas têm cara.
As vítimas têm história.
AS VÍTIMAS QUE FICAM TÊM UM FUTURO, DE QUE O BANDIDO VIRA O PRINCIPAL NARRADOR.
AS VÍTIMAS QUE FICAM TÊM UM FUTURO SEQUESTRADO PELO BANDIDO PROTEGIDO PELA LEI.
E isso é insuportável para os nefelibatas da desgraça alheia.
Volto ao “dimenor” do Rio
Ele entrou no ônibus, relatam as testemunhas e mostra o vídeo, passou a roleta, anunciou o assalto e pediu, calma e friamente, que os passageiros metessem seus pertences numa bolsa. A tarefa de recolhê-los foi atribuída a uma das vítimas. Mandou todo mundo para a traseira do veículo, escolheu uma mulher, levou-a para o centro do ônibus e executou o estupro, agredindo-a com a arma e ameaçando os demais: se alguém interferisse, ele matava.
Três aninhos para o rapaz. Tem 16 anos. Com 19, estará nas ruas. Ainda que se queira considerá-lo, de algum modo, incapaz e mantê-lo detido por mais algum tempo, é possível. Mas não há a menor hipótese de ele continuar recolhido depois dos 21 anos. A mulher estuprada não tem mais nenhuma proteção da lei. Ele tem.
O delegado que cuida do caso afirmou que o rapaz não deve ser muito bom da cabeça. 
Agora temos uma nova onda: gente “normal” não cometeria crimes — só os “loucos”. Pode não parecer à primeira vista, mas é mais uma maneira de proteger bandidos.
O governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP) apresentou, por intermédio da bancada do PSDB na Câmara, um projeto de lei que muda o ECA e permite que menores que cometem crimes hediondos fiquem pelos menos oito anos presos. A bancada apresentou, sim, mas a gente nota que os tucanos — ou, sei lá, a metafísica tucana, havendo uma… — não se entusiasmam pela ideia, nem mesmo num período, como é o pré-eleitoral, em que valores estão em disputa. No fim das contas, boa parte deles também acredita que se trata de mera questão axiológica — mas uma axiologia que não diz respeito ao povo, apenas a alguns poucos aos quais se consente o pensamento abstrato… Tucano gosta de discutir temas mais quentes como indexação de salários e inflação inercial, coisas que levam a população à loucura. Só se fala de outra coisa nas ruas.
Essa conversa de pena maior para menor que comete crime hediondo e descriminação ou não das drogas é vulgar demais, sabem?, é concreto demais. Eles também não gostam de ver a cara das vítimas. 
Por isso os emplumados mais graduados não deram apoio à proposta de Alckmin — a exceção foi José Serra, que, quando governador, já havia encaminhado texto parecido, com pena de até 10 anos. 
Serra, aliás, escreveu um artigo no Estadão defendendo a mudança da lei. 
Alguns tucanos devem ter entortado o bico pra ele: “Huuummm… Que reacionário! A gente é progressista”. E é mesmo, viu? Um dos que encaminharam um recurso ao Supremo pedindo que a lei que criminaliza também o porte de drogas (embora não mande ninguém para a cadeia) seja considerada inconstitucional é José Gregori, ministro dos Direitos Humanos do governo FHC. Se o Supremo acatar, as drogas estarão descriminadas no Brasil pela via cartorial.
Só para deixar claro: eu não quero “resolver o problema da violência” mantendo na cadeia por oito anos menores que cometem crimes hediondos. Eu só quero que gente que comete crime hediondo não tenha a impunidade garantida em lei, seja menor ou não.
Eu só quero que as vítimas, que têm cara, depois de terem um pedaço da sua história roubada pelos bandidos, não tenham também roubado, aí pelo Estado, o seu direito à Justiça.
Não é pedir muito.

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