Luís Inácio Adams, advogado-geral da União, decidiu atuar como agente da polícia política de Cuba
Reinaldo Azevedo
O advogado-geral da União, numa curta entrevista, protagonizou uma das cenas mais infames dos quase 11 anos de governo petista. Eu mal podia acreditar no que via e ouvia. Com os meridianos da hombridade ajustados, não teria falado o que falou. Depois de tê-lo feito, ainda que combalida, a hombridade remanescente deveria levá-lo a se demitir. Como ele vai ficar, o resto é conclusão óbvia. Já chego ao ponto. Antes, uma lembrança.
Adams conseguiu sair sem arranhões daquele assunto que quase todo mundo, muito especialmente a imprensa e a oposição, já esqueceu, embora permaneça sem solução: a quadrilha chefiada por um tal Paulo Vieira, que atuava no seio da Presidência da República. É o caso que envolve Rosemary Noronha, aquela senhora que passou a ser chamada de “amiga íntima de Lula”. Caro leitor, se você troca confidências com um amigo íntimo, conta-lhe coisas da sua vida privada, ouve conselhos, e atua com reciprocidade, isso pode ser uma amizade íntima. Se vocês decidirem ir para a cama, e não para dormir a prudente distância, aí é bem provável que ele seja seu amante. Sigamos.
A apuração custou a cabeça do então nº 2 da AGU, José Weber Holanda, que foi indicado pela PF por corrupção passiva. Holanda era homem da estrita confiança de Adams. Tanto é assim que o defenestrado foi até avalista do contrato da casa de aluguel em que mora o advogado-geral. Adams também frequentava a casa do encrencado, o que o forçou, na época, a emitir uma nota: “Eu conheci o Weber trabalhando na AGU. Durante esses dez anos de convivência, cheguei a frequentar a casa dele em alguns momentos. No entanto, na maioria das vezes, a minha relação com ele era técnica e profissional”. Certo! Técnica, profissional, mas na casa do rapaz, que foi seu fiador. Parece que os limites entre o público e o privado na AGU podem melhorar.
Benevolente, a imprensa deixou Adams de lado. E se acabou ignorando que o homem que cuidava mesmo do dia a dia da AGU era Holanda, que tinha todo o amparo do titular. Adams se sentiu injustiçado. Andou dizendo por aí que estava sendo vítima de fogo amigo, que setores do PT queriam derrubá-lo… Acabou se segurando no cargo. E, sei lá, talvez tenha visto no episódio da vinda dos médicos cubanos a chance de mostrar à petezada que ele é, sim, um bom companheiro entre bons companheiros.
Os jornalistas dirigiram a Adams uma questão absolutamente pertinente: qual será a reação do governo brasileiro caso médicos cubanos peçam asilo ao governo brasileiro? Respondeu a excelência: “Nesse caso me parece que não teriam direito a essa pretensão. Provavelmente seriam devolvidos.” E ele foi adiante, tentando explicar: “Todos os tratados, quando se trata de asilo, [consideram] situações que configurem ameaça por razões de ordem políticas, de crença religiosa ou outra razão. É nesses condições que você analisa as situações de refúgio. E, nesse caso, não me parece que configuraria essa situação”.
É um escárnio! Vindo do advogado-geral da União, é um acinte. Eu nem acho que médicos cubanos pedirão asilo. E por três razões principais — há uma penca delas:
1) são quadros do Partido Comunista;
2) mesmo com o governo cubano confiscando a maior parte do seu salário, ganhariam muito menos na ilha;
3) suas respectivas famílias não os acompanham — ficaram em Cuba, à mercê do regime.
Mas atenção! Digamos que houvesse o pedido; e aí? Adams já deu a resposta. O governo do Brasil repetirá o que fez com os dois pugilistas. Para usar a linguagem de Adams, se alguém se atrever a fazer isso, será “devolvido”. Adams virou agora porta-voz da polícia política cubana. Fosse Cuba um regime democrático, tal pergunta nem lhe seria dirigida. Ela só faz sentido porque estamos a falar de uma ditadura. E não que lhe faltasse a resposta óbvia e decente: “Não haverá exceção nesse caso; o Brasil procederá segundo as leis que tratam do assunto, e um eventual pedido seria analisado, mas não me cabe fazer especulações a respeito porque isso é da alçada do Ministério da Justiça”. E pronto! Mas não.
Adams, aquele que disse que petistas já tentaram derrubá-lo, decidiu dar uma resposta que não é a de um advogado-geral, mas a de um militante — ou própria de quem está se submetendo a uma orientação de caráter político e ideológico. Como ele pode afirmar, de antemão, que não existem motivos? Mas não pensem mal de Adams. A depender do caso, ele é favorável a refúgio, sim: defendeu, por exemplo, que o terrorista Ceare Battisti ficasse no Brasil. Ah, bom!
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