sexta-feira, 18 de outubro de 2013

"ESSE VANDALISMO NÃO ME REPRESENTA"




Os âncoras dos telejornais se referem aos manifestantes mascarados como vândalos, exibindo cenas de violência e destruição do patrimônio público e privado. No povo fala, prevalece o repúdio ao quebra-quebra e ao oportunismo sem causa, durante os movimentos populares reconhecidamente legítimos, no Rio de Janeiro e em São Paulo. A discórdia está instalada e isso alimenta a expectativa de que alguns setores querem desmobilizar as manifestações nos principais centros urbanos do país.

Dia desses, Ruy Castro, jornalista e escritor brasileiro, descreveu o estilo de vestir dos tais vândalos ou “black blocs”, após cruzar com dois deles num calçadão no Rio de Janeiro: coturno, calças, mochila, camiseta e jaqueta pretos, e … pedras, molotovs e máscaras contra gases, justificando ironicamente que “todo cuidado é pouco quando se tem a lei pela frente”, no pós-junho de 2013, que colocou o Brasil na rota dos indignados mundiais.

Está muito claro que, se não fosse a carona oportunista deles, nas manifestações pacíficas em todo o país, certamente ainda estaríamos contabilizando mais desgastes das principais instituições brasileiras. Estas edificam a representação do povo em nossa democracia representativa, que parece representar uma parcela na atual conjuntura política nacional.

Todo dia lemos opiniões e interpretações sobre o grito popular nas ruas, principalmente em relação ao comportamento da juventude, que estava muda desde o movimento pelo impeachment de Fernando Collor de Mello, da presidência da República, em 1992. Vivi intensamente o fim dos tempos do regime militar que se estabeleceu no Brasil de 1964 a 1985, quando em tese tivemos o início da Nova República. Havia um rescaldo de censura, bisbilhotice e repressão aos movimentos reivindicatórios.

Nossas bandeiras de fundo eram outras, e muitas delas serviram para garantir as manifestações de hoje em dia. O enfrentamento político exigia inteligência, criatividade e os meios de mobilização eram representativos. Refiro-me às entidades estudantis, sindicais e partidos, como organizações clandestinas ou não. Muitas vezes viajo no tempo, imaginando que, se tivéssemos naquela época o aparato de comunicação de hoje, governos já teriam caído, diante do descompasso das suas ações entre as necessidades gerais do país, o desgoverno e a corrupção.

Enchia o peito e abria a boca para relacionar a representatividade da UNE – União Nacional dos Estudantes, dos sindicatos, movimentos populares e partidos clandestinos atuantes no interior de legendas progressistas e de oposição. Esse cenário já não nos pertence mais. Apesar dos esforços individuais de algumas lideranças políticas, um abismo recortou a credibilidade destas, por conta do nivelamento por baixo, especialmente a partir do final de 2005, quando vieram à tona as denúncias sobre a existência de um pagamento regular de propinas a parlamentares do Congresso Nacional, que ficou bem conhecido como “mensalão”.

Ninguém esperava que a esperança acordasse a partir de uma contestação contra o aumento de R$ 0,20 no preço das passagens de ônibus. A ela juntou-se também a insatisfação sobre a precariedade dos transportes públicos e descolou a sensação de que saúde, educação e outras questões pontuais não vinham sendo tratadas com a mesma firmeza dos investimentos e notícias de superfaturamento das obras para a Copa do Mundo de Futebol, por exemplo.

Esse momento merece reflexão, até porque estamos a um ano de eleições importantes para o país. No entanto, parece que o vandalismo dos “black blocs” está a serviço de uma causa desconhecida, justamente porque ao invés de uma faixa ou cartolina com palavras de ordem, sobram tacos, molotovs e caras mascaradas. Sem intenção de pautar uma teoria conspiratória, não é difícil de ver o maniqueísmo de alguns setores políticos (partidários) do Brasil, insistindo na desmobilização da sociedade que optou ir para as ruas por consciência própria.

A moda vândala não me representa. Está chegando a hora de parar de tanta enganação. Há muito a conversar e a fazer pelo Brasil.

(*) Raul Christiano é professor universitário, escritor, jornalista e secretário municipal de Cultura de Santos. Um dos fundadores do PSDB.

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