Existe alguma coisa mais inútil, ociosa ou ridícula do que a discussão semântica sobre privatização ou concessão? Pode ser, mas vai ser difícil encontrá-la.
A imagem de um manifestante dando um pontapé no traseiro de um agente foi o que ficou como imagem icônica da oposição a um leilão de privatização durante o governo “neoliberal” do social-democrata Fernando Henrique.
Na semana passada, durante a realização do leilão do campo petrolífero de Libra, a jóia da coroa do “bilhete premiado” do pré-sal, houve escaramuças entre manifestantes e policiais, mas parecia apenas um replay compacto das manifestações de junho, sobre cuja natureza os sociólogos ainda nos devem uma explicação.
Houve a clássica foto dos leiloeiros e arrematadores segurando um martelo, mas por via das dúvidas, a presidente da República resolveu ficar longe do fragor das ruas e deixou para cantar vitória em mais um dos seus inúmeros solilóquios televisivos, onde ela diz o que quer sem o perigo de ser contestada.
Um sucesso ou um fracasso?
Do ponto de vista do significado estrito da palavra leilão - que significa a venda pública de um objeto pelo maior lance foi um fracasso. Houve apenas um consórcio concorrente, que levou o direito de explorar Libra pelo menor preço: devolução ao governo de 41,65% do lucro-óleo.
Do ponto de vista do negócio em si, os especialistas se dividiram: poderia ser melhor ou poderia ser pior, dependendo do viés do analista. Como disse o colunista José Paulo Kupfer, chamemos de empate.
Deixando de lado a ridícula batalha semântica sobre a diferença entre privatização e concessão, há algumas dúvidas que ficam pairando no ar e que só o tempo responderá.
1) O sistema de partilha é mais vantajoso para o País que o sistema de concessão que vinha sendo usado?
2) A Petrobrás continuará sendo submetida a um estrangulamento econômico como esse que a tornou a empresa mais endividada do mundo pelo cínico usufruto eleitoral que o governo faz dela? Continuará sendo obrigada a subsidiar preços de combustível em nome do combate à inflação ou a assumir encargos visivelmente superiores à sua capacidade operacional e de investimentos?
3) As previsões sobre o tamanho da jazida, da qualidade do óleo, do preço do barril e do seu custo de exploração serão confirmadas?
Se tudo correr bem, ótimo para o País. No mínimo, serão derrubados tabus obsoletos contra a participação de empresas privadas na exploração do petróleo, e embora a presidente seja obrigada a demonizar a privatização que seu governo mesmo está praticando, a esquizofrenia ideológica que atrasa o país a obriga a dizer que a reação às empresas estrangeiras no consórcio é “xenofobia”.
Ela que não espere, porém, que seus próprios jurássicos saiam à rua gritando "Go home, petroleiras" nem Wellcome Shell...
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Sandro Vaia é jornalista. Foi repórter, redator e editor do Jornal da Tarde, diretor de Redação da revista Afinal, diretor de Informação da Agência Estado e diretor de Redação de “O Estado de S.Paulo”. É autor do livro “A Ilha Roubada”, (editora Barcarolla) sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez e "Armênio Guedes, Sereno Guerreito da Liberdade"(editora Barcarolla)
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