domingo, 13 de julho de 2014

O BRASIL MOSTROU A SUA CARA

O Globo (Editorial)

Hoje chega ao fim uma jornada de sete anos, iniciada quando o Brasil venceu a disputa para sediar a Copa de 2014. Foi uma viagem cheia de percalços, com altos e baixos, e um desfecho muito ruim para o futebol brasileiro. A seleção não chegou ao hexa, e assim não pôde exorcizar 1950 no mesmo Maracanã da derrota histórica de há 64 anos.

E os sete gols sofridos na semifinal com a Alemanha ficarão como dolorosa marca nos cem anos de seleção brasileira. O estádio, renovado, coloca, porém, no currículo a honra de passar a ser o segundo do mundo, ao lado do mexicano Asteca, a servir de palco por duas vezes a uma final de Copa.



Adicione-se, ainda, a qualquer balanço de saldos do evento a enorme exposição que teve o Brasil nos meios de comunicação globais, ajuda incalculável na atração de viajantes. Vai caber à indústria do turismo cativá-los.

No muito que se disse sobre a catastrófica derrota da seleção no Mineirão, identificaram-se entre as raízes da humilhação imposta pelo time alemão algumas facetas observadas na comissão técnica, mas que também fazem parte da vida pública brasileira: a arrogância, a empáfia, o ufanismo, a autossuficiência

O projeto da Copa começou com alguma contaminação desses ingredientes. O então presidente Lula, lembre-se, desejava um número de cidades-sede superior às 12 do projeto final. E ficou provado que, se a Copa de 2014 tivesse se limitado a menos estados, com melhores condições de infraestrutura, o custo final para o contribuinte teria ficado menor, sem que o evento perdesse o brilho que teve. Além de haver uma quantidade menor de obras, um flanco vulnerável da Copa, como se confirmou.

Animal político, Lula pode ter percebido as oportunidades que o torneio daria, em ano eleitoral, para que ele desfilasse ao lado da candidata à reeleição Dilma Rousseff em estádios novos ou reformados. Mas, antes, precisava eleger a ministra em 2010. Conseguiu.

Trapaças da vida real não o deixaram dar o fecho neste plano de rara antevisão política. A inflação, a impopularidade em alta, as vaias impediram-no. E, no fim, a própria derrota da seleção, e da maneira como ocorreu, foi tremendo gol contra os planos de marquetagem político-eleitoral.
(...)

Já tinha sido previsto que não haveria maiores dificuldades nos estádios, apesar dos atrasos. Elas estariam fora deles. Dados do próprio Ministério do Planejamento: apenas 24 das 70 obras de mobilidade urbana financiadas com recursos federais ficaram prontas. Ou seja, só 30%. Grande parte do legado para a população ainda está pelo caminho.

Mais soluções “meia-boca” para contornar o obstáculo: decretar feriado nas cidades-sede em dia de jogo. Com menos veículos e pessoas nas ruas, a falta de estrutura de transporte público condizente faz menos estragos.

O Brasil mostrou a sua cara: festeiro, alegre e hospitaleiro, mas incompetente em planejamento, administração de custos — sem falar em superfaturamentos, outro esporte nacional — e em gerenciamento de obras. Resta uma tênue esperança de que alguma lição tenha sido aprendida com vistas às Olimpíadas do Rio, daqui a dois anos. Mas o tempo é curto.

Criou-se, durante um mês, uma espécie de Brasil de fantasia: segurança extrema, feriados, menos dias de trabalho. A Copa, indiscutivelmente, foi um sucesso. Mas, a partir de amanhã, volta a dura realidade do cotidiano.

Leia a íntegra em O Brasil mostrou a sua cara

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