domingo, 21 de setembro de 2014

O SOCIAL VERSUS O AJUSTE ECONÔMICO: O FALSO DEBATE

Mansueto Almeida

Quem conhece Marcos Lisboa sabe como deve ter sido difícil para ele debater com Marcelo Neri sobre desigualdade de renda e os desafios para a continuidade deste processo (veja o debate aqui).

O grande problema nesse debate é que, de acordo com o Marcelo Neri, há dois modelos em disputa. Um modelo que prioriza o ajuste macro e um outro modelo que priorizaria a continuidade da queda da pobreza e desigualdade. Ou seja, estaria em disputa o modelo dos homens gananciosos e egoístas da Faria Lima, da Paulista e da Vieira Souto contra o modelo dos bons que favorece o semi-árido nordestino, baixada fluminense, etc. Como coloca Marcelo Neri:

“Eu acho que existe uma lógica. Quando a desigualdade cai durante 12, 13 anos consecutivos – e começou a cair em 2001 – ela beneficia um mais uns do que outros. Isso mexe com interesses. Não estou falando que esse é o seu projeto… Estou fazendo o contraponto porque acho que a gente está num momento em que existe uma polarização que é muito ruim para o País. E há razões de economia política por trás disso…”

Marcelo insiste neste ponto. Meu amigo Marcos Lisboa adverte, no entanto, que este é um falso debate, pois ninguém seria contra a redução da pobreza e da desigualdade de renda, mas sim a melhor forma –leia-se politica econômica- para continuar com esse processo. Marcos Lisboa lembra que:

“Essa polarização agrada à política. Agrada à retórica. Vai de encontro aos temas centrais. A questão é: a política social no Brasil não é conquista de um governo. É uma conquista da sociedade e precisa ser preservada. Estamos ainda hoje nos beneficiando do que o País construiu em 20 anos. Infelizmente, houve essa opção pelo protecionismo, pelo fechamento da economia, por essa agenda de concessão de benefícios a setores escolhidos que batem em Brasília – um benefício tributário para o setor A, para o setor B, uma proteção para a indústria C. Minha preocupação é que isso vai colocar em risco tudo que eu e você, Marcelo, acreditamos que seja o melhor para o social.”

A tese do Marcos é muito simples: a estagnação do crescimento da produtividade e logo, o baixo crescimento da economia, colocam em risco as conquistas sociais que não é de um ou dois governos, mas de vários. Acho que o próprio Marcelo Neri falava isso. Por exemplo, vamos dar uma olhada em um longa entrevista que Marcelo Neri deu, em 2010, ao jornalista Fernando Dantas do Estado de São Paulo (clique aqui). Destaco alguns trechos desta entrevista.

Fernando Dantas: A pobreza e a desigualdade caíram por causa dos programas sociais?

Eles ajudaram, sem dúvida, mas o grande destaque é a renda do trabalho. Basicamente, 70% do aumento de renda média, e 2/3 da redução da desigualdade no Brasil desde 2003 se deve à renda do trabalho. No Nordeste, que seria a terra dos programas sociais, a chamada economia sem produção, a renda do trabalho e a renda total crescem na mesma taxa, ou seja, há algo mais sustentável no Nordeste do que se pensa.

Fernando Dantas: Por que isso está acontecendo?

Provavelmente as pedras fundamentais foram colocadas lá no Plano Real, que deu estabilidade para o governo e para as empresas, e proporcionou as condições de se pensar o futuro, uma agenda mais estrutural, e, inclusive, se pensar em colocar todas as crianças na escola. Os resultados que vemos hoje têm por trás um longo período de boas políticas econômicas e sociais, e o Plano Real talvez tenha sido o momento inicial desse processo.

Fernando Dantas: A educação está ligada ao aumento da renda do trabalho?

Sim. Nós tínhamos 16% das crianças de 7 a 14 fora da escola em 1990, em 2000 esse número já tinha caído para 4% e agora está em 2%. Então, à medida que essas crianças, que eram adolescentes nos anos 90, chegaram ao mercado de trabalho, com a inflação baixa, a sociedade sabendo que não viria mais um plano econômico maluco para embaralhar as cartas, a economia começou a produzir esse crescimento chinês na base da distribuição. Houve abertura da economia, estabilização, reforma meia-sola da Previdência, privatização. Isso traz custos imediatos mas, em prazo mais longo, a economia ganha competitividade. E as próprias crises dos anos 90 obrigaram o Brasil a fazer o dever de casa, com ajuste fiscal, o Proer, que deu solidez ao sistema bancário, etc.


Leia a íntegra AQUI.

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