"Bons líderes protegem a oposição"
Para o pensador búlgaro, a moderação é o traço chave das democracias. Inversamente, o descomedimento é o vício que engendra seus "inimigos íntimos". Em entrevista ao site de VEJA, Todorov analisa o combate a essas ameaças e ressalta a importância da crítica para a saúde das democracias
Desde a vitória nas urnas, a presidente Dilma Rousseff já apareceu cinco vezes na TV tartamudeando que "diálogo" será o mote deste seu segundo mandato. Foi o que tentou fixar no palanque do PT, domingo à noite, e nas entrevistas a emissoras de televisão nos dias seguintes. As palavras ensaiadas – "união", "abertura", "parceria", "pontes" etc. – afetavam humildade e moderação. Na tela da TV, no entanto, o sinal pareceu inverter-se, traindo empáfia e descomedimento. Já no discurso de vitória, Dilma bronqueou com a plateia, porque se impacientou com a algazarra e a voz lhe sumia. Tolerou, contudo, imprecações contra a imprensa... No dia seguinte, em sua primeira entrevista ao vivo, irritou-se com perguntas sobre o cenário econômico, gracejou da jornalista da TV Record e insistiu nas meias-verdades e falsificações do marketing de campanha – é sintomático que, nesses momentos, tenha se sentido tentada a falar para as câmeras, sorrindo, como se gravasse o horário eleitoral. A certa altura, instada a falar às dezenas de milhões de eleitores de seu adversário, o tucano Aécio Neves, atribuiu a vitória do PSDB em São Paulo à desinformação e recomendou que lhe perguntassem sobre sua expressiva votação no Nordeste. E antes de qualquer chance de "diálogo" ou "união", mostrou-se determinada a impor a agenda da "reforma política por meio da consulta popular", tema especialmente desagregador, como se viu em 2013 e, tudo indica, se verá novamente em 2015.
Nem "coração valente", nem "paz e amor": comedimento é o traço chave das democracias. Inversamente, o vício do descomedimento — ou o que os gregos chamavam húbris — é o que engendra o que o historiador, sociólogo e crítico literário búlgaro Tzvetan Todorov chamou deOs Inimigos Íntimos da Democracia (Companhia das Letras, 216 páginas). "O povo, a liberdade, o progresso são elementos constitutivos da democracia", escreve Todorov, "mas se um deles se emancipa de suas relações com os outros, escapando assim a qualquer tentativa de limitação e erigindo-se em único e absoluto, eles transformam-se em ameaças: populismo, ultraliberalismo, messianismo." O site de VEJA conversou com Todorov às vésperas da eleição mais disputada e menos "comedida" da história brasileira, que acabou premiando uma campanha disposta a "fazer o diabo" para vencer. O historiador observa que a maioria das modernas democracias abriga de fato um eleitorado profundamente dividido. "As disputas são geralmente vencidas por 51% contra 49%", disse, profeticamente – Dilma cravaria exatos 51,64%, contra 48,36% de Aécio. "Mas é importante que os eleitos mostrem que são os governantes do país inteiro. Os bons líderes protegem a oposição também."
Leia a entrevista AQUI.
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